Resumo
Objetivo: debater, a partir de revisão de literatura e de dispositivos normativos, conflitos éticos e paradoxos jurídicos que permeiam a tipificação adotada pela tutela penal para enquadramento do aborto criminoso, seus meios de prova produzidos pela medicina legal e o disposto no código de ética médica acerca do sigilo profissional. Metodologia: utilizou-se uma abordagem qualitativa com natureza descritiva e exploratória. Foi realizada revisão bibliográfica de artigos, normas e jurisprudência a partir de descritores pré-definidos. Resultados: a prova pericial na investigação de aborto criminoso constitui-se em ato que afronta o dispositivo do código de ética médica referente ao sigilo profissional, além de ferir a prerrogativa de autonomia dos corpos das mulheres e o preceito da não autoincriminação. Conclusões: a proteção das normas deontológicas referentes ao sigilo médico não tem sido capaz de conferir tratamento adequado a gestante nos casos de investigação de abortamento criminoso, sobretudo se considerados as bases fundamentais dos direitos reprodutivos: integridade corporal, autonomia pessoal, igualdade e diversidade.
Referências
Roseira MB. Prefácio. In: Galeotti G. História do aborto. Lisboa: Edições 70, 2007. p. 7-20.
Diniz D. Aborto e saúde pública no Brasil. Cadernos de Saúde Pública, Rio de Janeiro. 2007, 23 (9): 1992-1993.
Diniz D, Medeiros M. Aborto no Brasil: uma pesquisa domiciliar com técnica de urna. Ciência & Saúde Coletiva, Rio de Janeiro. 2010; 15: 959-966.
Brasil. Conselho Federal de Medicina. Resolução n 2.217, de 27 de setembro de 2018. Código de Ética Médica. Brasília, 1 nov 2018. Disponível em: https://sistemas.cfm.org.br/normas/visualizar/resolucoes/BR/2018/2217. [Acesso em: 07 de outubro de 2019].
Brasil. Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940. Código Penal. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del2848compilado.htm. [Acesso em: 17 de outubro de 2019].
De Placido e Silva OJ. Vocabulário Jurídico. 32 ed. Rio de Janeiro: Forense; 2016.
Barros FAM. Direito Penal: Parte Especial: crimes contra a pessoa, crimes contra o patrimônio. 2ª ed. São Paulo: Saraiva; 2009.
Gomes H. Medicina legal. Rio de Janeiro: Freitas Bastos; 2004.
Capez F. Curso de Direito Penal. v. 2. 19 ª ed. São Paulo: Saraiva; 2019.
World Health Organization. Unsafe abortion: global and regional estimates of the incidence of unsafe abortion and associated mortality in 2008 [Internet]. Geneva: World Health Organization; 2011. Disponível em: http://whqlibdoc.who.int/publications/2011/9789241501118_eng.pdf. [Acesso em: 15 de abril de 2020].
Brasil. Ministério da Saúde. Atenção Humanizada ao abortamento. Norma Técnica. 2ª ed. Brasília, 2011. Disponível em: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/atencao_humanizada_abortamento_norma_tecnica_2ed.pdf. [Acesso em: 16 de outubro de 2019].
Faúndes A, Barzelatto J. O drama do aborto: em busca de um consenso. Campinas, SP: Komedi; 2004.
Ribeiro FRG, Spink MJP. Repertórios interpretativos na controvérsia sobre a legalização do aborto de fetos anencefálicos. Psicologia & Sociedade, 2011; 23: 63-71.
World Health Organization. Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados à Saúde – CID-10. Disponível em https://icd.who.int/browse10/2019/en. [Acesso em: 15 de abril de 2020].
Bitencourt CR. Tratado de direito penal, volume 2: parte especial. 19ª ed. revista e atualizada. São Paulo: Saraiva; 2019.
Masson C. Direito penal esquematizado. São Paulo: Método; 2011.
Croce D, Júnior DC. Manual de Medicina Legal. 7. ed. rev. São Paulo: Saraiva; 2010.
Abrahão PJ. A perícia no aborto criminoso. Conteúdo Jurídico, 2014. Disponível em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/artigos/41677/a-pericia-no-aborto-criminoso. [Acesso em: 06 out 2019].
Torres ACPLGC, Figueiró MND, Mendes PP, Melo SMM, Inaba CM. Aborto no Brasil: argumentos a favor e contra a sua proposta de descriminalização. Anais do III Simpósio Internacional de Educação Sexual. 2013; 3: 1-17. Disponível em: http://www.sies.uem.br/anais/pdf/direito_e_sexualidade/2-01.pdf. [Acesso em 21 de outubro de 2019].
Bitencourt CR. Tratado de direito penal: parte geral. 25ª. ed. São Paulo: Saraiva, 2019.
Brasil. Constituição da República Federal do Brasil. Brasília, DF: Senado Federal, 1988. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm. [Acesso em: 15 de abril de 2020].
Cesca BG, Orzari OAS. Prova Penal e Segredo Profissional. Revista da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo. 2016; 111: 555-586. Disponível em: http://www.revistas.usp.br/rfdusp/article/view/133529. [Acesso em: 31 de março de 2020].
Villas-Boas ME. O direito-dever de sigilo na proteção ao paciente. Revista Bioética. Brasília, 2015; 23 (3):513-523. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1983 80422015000300513&lng=en&nrm=iso>. [Acesso em: 12 de outubro de 2019].
Warembourg-Auqe F. Réflexions sur le secret professionnel. Revue de Science Criminelle et de Droit Pénal Comparé, Paris, 1978; 2: 241. Disponível em: http://data.decalog.net/enap1/Liens/fonds/REVUE_SCIENCE_CRIMINELLE_1_1986.pdf. [Acesso em: 31 de março de 2020].
Loch JA. Confidencialidade: natureza, características e limitações no contexto da relação clínica. Bioética. 2003;11(1):51-64. Disponível em: http://revistabioetica.cfm.org.br/index.php/revista_bioetica/article/view/149. [Acesso em: 31 de março de 2020].
Organização das Nações Unidas. Resolução 217 A (III), de 10 de dezembro de 1948. Declaração Universal dos Direitos Humanos. ONU. Disponível em: https://nacoesunidas.org/wp-content/uploads/2018/10/DUDH.pdf. [Acesso em: 21 de outubro de 2019].
Brasil. Decreto-Lei nº 3.689, de 03 de outubro de 1941. Código de Processo Penal. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del3689compilado.htm. [Acesso em: 17 de outubro de 2019].
Brasil. Lei nº 13.105, de 16 de março de 2015. Código de Processo Civil. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/lei/l13105.htm. [Acesso em: 09 de outubro de 2019].
Leite FBC, Gunther LE. A relativização do sigilo profissional médico. Revista eletrônica do Tribunal Regional do Trabalho da 9ª Região. 2013, 3 (25): 24-33. Disponível em: https://ead.trt9.jus.br/moodle/pluginfile.php/33329/mod_resource/content/1/Revista%20Eletr%C3%B4nica%20%28JAN%202017%20-%20n%C2%BA%2056%20-%20%C3%8Dndice%29.pdf. [Acesso em: 31 de março de 2020].
França GV. O Segredo Médico e nova ordem bioética, 2000. Disponível em: https://social.stoa.usp.br/articles/0015/4649/Texto_2_-_O_Segredo_MA_dico_e_nova_ordem_bioA_tica.pdf. [Acesso em 20 de outubro de 2019].
Brasil. Lei nº 6.259, de 30 de outubro de 1975. Dispõe sobre a organização das ações de Vigilância Epidemiológica, sobre o Programa Nacional de Imunizações, estabelece normas relativas à notificação compulsória de doenças, e dá outras providências. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L6259.htm. [Acesso em: 21 de outubro de 2019].
Brasil. Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990. Estatuto da Criança e do Adolescente. Brasília, 13 jul. 1990. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8069.htm. [Acesso em: 05 de outubro de 2019].
Brasil. Tribunal de Justiça de São Paulo, 3ª Câmara de Direito Público. Apelação Cível 1017294-93.2017.8.26.0344. Apelante: Marina Araújo Matsui. Apelada: Mireli Fernanda Belini. Relator: Maurício Fiorito. São Paulo, 13 de agosto de 2019. Disponível em: https://tj-sp.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/755067858/apelacao-civel-ac-10172949320178260344-sp-1017294-9320178260344/inteiro-teor-755067878?ref=serp. [Acesso em: 31 de março de 2020].
Brasil. Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, 1ª Turma Recursal Criminal. Apelação Criminal 0037981 74.2013.8.19.0205 RJ. Apelante: Marcelo Barbosa de Souza. Apelado: Ministério Público. Relator: Alessandra de Araújo Bilac Moreira Pinto. Rio de Janeiro, 30 de julho de 2015. Disponível em: https://tj-rj.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/217590053/apelacao-criminal-apr-379817420138190205-rj-0037981-7420138190205?ref=serp. [Acesso em: 15 de abril de 2020].
Brasil. Conselho Federal de Medicina. Resolução nº 1.605/2000. Revelação de conteúdo de prontuário ou ficha médica. Disponível em: http://www.portalmedico.org.br/resolucoes/cfm/2000/1605_2000.htm. [Acesso em: 31 de março de 2020].
Brasil. Conselho Regional de Medicina/SP. Consulta nº 24.292/00. O segredo médico diante de uma situação de aborto. Disponível em: https://sistemas.cfm.org.br/normas/visualizar/pareceres/SP/2000/24292. [Acesso em: 31 de março de 2020].
Brasil. Conselho Federal de Medicina. Processo Consulta nº 1.973/2000. Diretor clínico – Fornecimento de documentos de pacientes a delegados de Polícia, promotores e juízes Disponível em: https://sistemas.cfm.org.br/normas/arquivos/pareceres/BR/2000/22_2000.pdf. [Acesso em: 31 de março de 2020].
Brasil. Tribunal de Justiça de São Paulo. Habeas Corpus nº 2188894-33.2017.8.26.0000, Relator: Airton Vieira, 3ª Câmara de Direito Criminal, Data de Publicação: 25 de outubro de 2017. Disponível em: https://tj-sp.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/517121329/21888943320178260000-sp-2188894-3320178260000/inteiro-teor-517121345?ref=serp. [Acesso em: 31 de março de 2020].
Brasil. Tribunal de Justiça de São Paulo, 16ª Câmara de Direito Criminal. Habeas Corpus nº 0296145-57.2011.8.26.0000. Relator: Alberto Mariz de Oliveira. Data da publicação: 17 de julho de 2012. Disponível em: https://tj-sp.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/22132136/habeas-corpus-hc-2961455720118260000-sp-0296145-5720118260000-tjsp. [Acesso em: 31 de março de 2020].
Brasil. Câmara dos Deputados. Projeto de Lei nº 4.880/2016. Acrescenta dispositivo à Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990. Disponível em: https://www.camara.leg.br/proposicoesWeb/fichadetramitacao?idProposicao=2091284. [Acesso em: 31 de março de 2020].
Brasil. Proposta de Emenda à Constituição nº 29/2015. Altera a Constituição Federal para acrescentar no art. 5º, a explicitação inequívoca “da inviolabilidade do direito à vida, desde a concepção. Disponível em: https://www25.senado.leg.br/web/atividade/materias/-/materia/120152. [Acesso em: 15 de abril de 2020].
Brasil. Projeto de Lei nº 5.069/2013. Tipifica como crime contra a vida o anúncio de meio abortivo e prevê penas específicas para quem induz a gestante à prática de aborto. Disponível em: https://www.camara.leg.br/proposicoesWeb/fichadetramitacao?idProposicao=565882. [Acesso em: 15 de abril de 2020].
Brasil. Projeto de Lei nº 1.316/2015. Dispõe sobre a obrigatoriedade de comunicação imediata às autoridades policiais em caso de ocorrência de aborto na rede de saúde pública do estado do Rio de Janeiro. Disponível em: http://alerjln1.alerj.rj.gov.br/scpro1519.nsf/1061f759d97a6b24832566ec0018d832/4b1b4fce7c27882d83257f1f006f5700?OpenDocument. [Acesso em: 15 de abril de 2020].
Brasil. Conselho Regional de Medicina do Paraná. Resolução nº 05/1984. Dispõe sobre casos constitutivos de dever legal e justa causa. Curitiba, 21 mai 1984. Disponível em: https://sistemas.cfm.org.br/normas/arquivos/resolucoes/PR/1984/5_1984.pdf. [Acesso em: 15 de outubro de 2019].
Brasil. Conselho Regional de Medicina do Paraná. Parecer nº 1.105/1998. Dispõe sobre prontuário médico – cópia à autoridade policial. Disponível em: https://sistemas.cfm.org.br/normas/visualizar/pareceres/PR/1998/1105. [Acesso em: 15 de abril de 2020].
Brasil. Decreto-lei nº 3.668, de 03 de outubro de 1941. Lei das Contravenções Penais. Disponível em: https://www2.camara.leg.br/legin/fed/declei/1940-1949/decreto-lei-3688-3-outubro-1941-413573-publicacaooriginal-1-pe.html. [Acesso em: 15 de abril de 2020].
Brasil. Conselho Federal de Medicina. Resolução nº 1.497/1988. Dispõe sobre as atividades de médico perito. Disponível em: https://sistemas.cfm.org.br/normas/visualizar/resolucoes/BR/1998/1497. [Acesso em: 31 de março de 2020].
Petchesky R. Owning and disowning the body: a reflection. In: Baksh R.; Harcourt W. The Oxford Handbook of Transnational Feminist Movements. Nova Iorque: Oxford University Press, 2015. p. 252-270. Disponível em: https://www.oxfordhandbooks.com/view/10.1093/oxfordhb/9780199943494.001.0001/oxfordhb-9780199943494. [Acesso em: 31 de março de 2020].
Brasil. Conselho Federal de Enfermagem. Relatório do seminário de debate sobre os efeitos da criminalização do aborto na saúde coletiva, 2019. Disponível em: http://www.cofen.gov.br/relatorio-do-cofen-recomenda-humanizacao-da-assistencia-e-sigilo-em-casos-de-aborto_68851.html. [Acesso em: 31 de março de 2020].
Este trabalho está licenciado sob uma licença Creative Commons Attribution-NonCommercial 4.0 International License.
Copyright (c) 2020 CADERNOS IBERO-AMERICANOS DE DIREITO SANITÁRIO